segunda-feira, 30 de julho de 2012

Katy Perry: Part of Me

(EUA, 2012) Direção: Dan Culforth e Jane Lipsitz. Com depoimentos de Katy Perry, Adele, Keith Hudson, Mary Hudson e outros.


Por João Paulo Barreto

Admito que ao entrar no cinema para a sessão de Part of Me, documentário que registrou a exaustiva turnê do fenômeno Katy Perry, só conhecia o hit I Kissed a Girl, onde a bela e talentosa cantora declara suas experiências com o mesmo sexo. Gosto da música. Havia ouvido uma versão acústica da canção e ao ver a carismática interprete e compositora constatei que talento e beleza podem vir no mesmo conjunto.

Em Part of Me, a canção é interpretada não em sua face unplugged, mas em uma que condiz bem com a imagem que a jovem passa para seu público. Repleto de cores, brilhos, repetidas trocas de figurino (até mesmo em cima do palco), dançarinos, purpurina e, inclusive, com direito a uma pessoa fantasiada de gato, a ambientação dos shows reflete o público em sua maioria. Composto majoritariamente por crianças e adolescentes, os fãs de Katy Perry participam do documentário em depoimentos que, de tão sinceros, chegam a ser constrangedores, como quando um garoto entrevistado afirma, aos 14 anos, que Perry mudou sua vida completamente.

Buscando sempre enfocar a cantora e sua relação carinhosa com os fãs, o documentário funciona como forma de causar ainda mais simpatia destes pela artista. Não por acaso, vê-se o esforço da equipe em agradar os fãs ao convidar diversos deles para subir ao palco. Além disso, Perry parece se esforçar para vincular sua imagem à de uma adolescente. Algo que não deve ser visto como um problema, apenas como uma ferramenta mercadológica. Assim, quando uma criança lhe pergunta sua idade e ela responde que tem 27, não é de todo surpreendente que o garotinho replique afirmando que ela parece ter 16. Ainda mais quando ela mesma afirma que não quer ter bebês agora pois ainda é um bebê. Crianças são sempre sinceras e falam sem pensar, afinal de contas.

Katy e sua relação com os fãs: imagem muito em trabalhada
A estrutura do documentário é construída de forma a seguir cronologicamente os shows da turnê mundial. Conta, claro, com a clichê cena onde a montagem acelerada da estrutura do palco é mostrada. Sobre a grandiosidade da equipe da cantora, interessante é o depoimento do seu agente, que compara a quantidade de caminhões que a atual turnê possui com o começo da carreira de Perry, quando seus shows costumavam ser mais modestos. É quando passamos a conhecer as origens da garota, com imagens de arquivo pessoal e depoimentos de  familiares.

O melhor deles é, de longe, o dos pais de Katy. Religiosos fervorosos, membros da igreja pentecostal americana (onde o pai de Kate é ministro), os dois aparecem desconfortáveis com o teor de algumas letras da filha. A mãe chega a afirmar que não gosta de I Kissed a Girl. Curioso é o momento em que ela fala que não quer a filha aparecendo com poucas roupas em público, algo que o pai corrobora pedindo calma à esposa e falando que a filha não aparecerá assim. Mas nada que a fortuna ganha pela jovem não os faça rever seus conceitos, obviamente.

Personagens interpretados pela cantora no palco e em clipes
Ao exibir os familiares de Perry, o filme acaba caindo em um falso e desnecessário drama que, ao funcionar inicialmente por trazer a bem vista face familiar da cantora, acaba por dar um tiro no próprio pé no momento em que é abordado o começo da carreira de Katy. Em uma cena um tanto constrangedora de se assistir, ela afirma que chegou a ligar para o irmão para pedir dinheiro, algo que este explica às câmeras que não pôde ajudar, pois na época não tinha dinheiro nem para si mesmo. Em qual igreja mamãe e papai estavam nessa ocasião?

Pecando por desenvolver demais o lado esposa da cantora ao enfatizar seu esforço em manter o casamento com o comediante Russel Brand (ela costumava interromper a turnê e viajar da Europa para os Estados Unidos apenas para vê-lo), uma vez que nenhum depoimento do ator sobre a versão do término do relacionamento ou até mesmo sobre sua relação com a carreira meteórica da esposa é inserido no longa. Ao final, quando vemos a cantora chorar deprimida no camarim antes do show em São Paulo, não fica difícil uma análise superficial e parcial sobre o seu ex-marido.

Única artista a emplacar cinco hits em primeiro lugar nas paradas (algo que o filme salienta bem ao afirmar nem Os Beatles ou Elvis conseguiram), Katy Perry é, de fato, um fenômeno. E seu filme reflete bem o oportunismo dos produtores em aproveitar o momento da cantora. E ao vender a imagem de nice girl em todo o longa, a produção mostra que, realmente, os tempos mudaram na música pop. Atitudes à la Axl Rose e Kurt Cobain saíram de moda. O que, em tempos tão violentos, não deixa de ser uma boa notícia.

Porém, quando os créditos finais sobem, a sensação de ter visto um longo episódio de Glee não é acidental. Poderia ser pior. Poderia ser um longo episódio de Rebelde.

Se bem que pensando agora...

(PS. Em diversos momentos da projeção, ao ver as roupas que Perry usava no palco, as chacretes vinham à mente. Opa, entreguei a idade... = )



31 Minutos - O Filme


(2008 - Chile, Brasil, Espanha) Direção: Alvaro Diaz e Pedro Peirano. Dublado por Márcio Garcia, Daniel de Oliveira, Mariana Ximenes e Guilherme Briggs.


Por João Paulo Barreto

Ok, preciso confessar. Adoro fantoches. Os Muppets sempre foram meus bichinhos televisivos preferidos e minha infância foi muito mais feliz por causa da TV Colosso. Deixando isso claro, já posso começar dizendo que o longa metragem baseado na série de TV chilena 31 Minutos, me cativou por conseguir captar o melhor desse universo infantil, mas, ainda assim, elevar o sarcasmo e o cinismo por traz de muitas tiradas que remetem aos já citados Muppets.

Claro que é impossível não lembrar dos bonecos criados por Jim Henson em 1955. Os Muppets funcionam como referência para qualquer programa ou filme voltado para crianças que utilize fantoches como personagens principais.  A diferença é que, em 31 Minutos, a sutileza que as situações e falas contidas nos episódios do programa norte americano não é encontrada. As piadas são mais chulas e, talvez por isso, o filme acabe tendo um apelo mais adulto e menos infantil. Algo que já vemos rotineiramente em Os Simpsons. Não para menos, muitas gargalhadas que dei na sala de projeção não eram acompanhadas pelos risos das crianças presentes.

Amigos reunidos: Tulio, Juanin e Juan nos bastidores do jornal 31 Minutos
Exibido não Brasil apenas em canais por assinatura, o programa infantil 31 Minutos está no ar na TV chilena desde 2003 e apresenta, em forma de telejornal, diversas sátiras de notícias ocorridas no país. Sucesso de público, foi levado ao cinema pelos próprios criadores Álvaro Diaz e Pedro Peirano em 2008. Co-produção Chile, Brasil e Espanha, o filme teve cenas filmadas no Rio de Janeiro e chega às salas de projeção nacionais com quatro anos de atraso.

O texto, escrito a seis mãos pelos próprios dubladores originais da película (algo que já denota a dedicação positiva dos produtores ao projeto), conta a simples história de Juanin, um fantoche fofinho (não saberei dizer qual a representação animal dele. Se é que há alguma) que trabalha na produção do jornal 31 Minutos, apresentado pelo seu melhor amigo, o escandaloso Tulio Triviño (que lembra um macaco, mas tenho minhas dúvidas). Quando a malvada colecionadora Cachirula resolve destruir a reputação de Juanin com a intenção de afastá-lo da televisão e sequestrá-lo, todos os seres daquele mundo composto apenas por fantoches saem em busca do amigo acusado injustamente de destruir a reputação do jornalista espalhafatoso.

Caminho da roça: o surreal passeio de Juanin pelas ruas da metrópole
Diferente dos Muppets, o universo de 31 Minutos é ocupado exclusivamente pelos fantoches. As cenas em que vemos Tulio (esse, perceptivelmente, um homem fantasiado) dirigindo um Mercedes e Juanin pedalando em seu triciclo, chamam atenção tanto pela sua graça quanto pelo surreal. Do mesmo modo, alguns dos diálogos e situações se destacam em seu apelo cômico e no quão estranho é vê-los em um filme de apelo infantil. Desde alusões da expressão “há anos” com seu equivalente sonoro escrito com “u”, passando pelo momento em que os fantoches são engolidos por uma baleia e expelidos por uma saída não muito higiênica, o filme acaba por divertir mais adultos que crianças.

A dublagem em português foi feita por Márcio Garcia (que, após o tigre Diego da franquia A Era do Gelo,vem se destacando como dublador infantil), Daniel de Oliveira e Mariana Ximenes. Apesar da adaptação nacional, como de praxe, acabar por trazer desnecessárias referências regionalistas, alguns personagens com sotaque carioca têm sua graça (em especial para o insano delegado de polícia, que usando um Ray Ban clássico, me pareceu um amalgama ente o Animal dos Muppets e o Jesse Valadão).

Ao final, o sorrisão na cara é inevitável. Principalmente ao perceber que até Sartre pôde ser visto no texto de 31 Minutos: em determinado momento, quando alguns personagens são libertados de uma jaula, o impaciente herói Juan Carlos Bodoque, uma espécie de coelho à la Doonie Darko, dublado por Guilherme Briggs, diz: “Saiam da jaula, mocorongos. Para isso serve a liberdade”.

O francês vesgo sorriria orgulhoso. 

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge

(The Dark Knight Rises, EUA, 2012) Direção: Christopher Nolan. Com Christian Bale, Michael Caine, Gary Oldman, Tom Hardy, Anne Hathaway, Marion Cotillard, Morgan Freeman, Joseph Gordon-Levitt


Por João Paulo Barreto

Acabou. Sete anos após a estreia de Batman Begins, Christopher Nolan encerra a franquia que trouxe de volta o verdadeiro espírito do Cavaleiro das Trevas aos cinemas após as desastrosas versões protagonizadas por elementos que não merecem ter seus nomes citados. Ao sair da sessão de The Dark Knight Rises, o sentimento de dever cumprido era pleno. O diretor e roteirista conseguiu criar uma obra que, apesar de não superar o anterior, conseguiu manter um equilíbrio entre a necessidade de um encerramento à altura da saga e a possibilidade de referenciar os arcos dos quadrinhos que podem ser reconhecidos nesse novo longa.

Claro, o diretor não era obrigado utilizar nenhuma referência direta vinda das páginas das revistas. No entanto, o modo como ele inseriu pontos claramente oriundos dos impressos e sutis adaptações de momentos já vistos nas publicações da DC Comics, permite que tanto o espectador não iniciado no universo dos quadrinhos quanto o fã do Batman apenas cinematográfico consiga vivenciar um roteiro que, literalmente, deixa o público esgotado ao testemunhar os acontecimentos apresentados nas duas horas e quarenta e cinco minutos deste último capítulo. E se uso o termo “esgotado” para caracterizar isso, o faço a partir do lado positivo que a palavra possui.

Tom Hardy como Bane: olhos injetados em atuação sublime


Bane, da mesma forma que o Coringa de Heath Ledger, é um terrorista. Ambos são anarquistas, porém a potencialidade política do discurso do vilão de Rises o torna mais profundo que o deformado personagem vivido pelo falecido ator. “Algumas pessoas só querem ver o mundo em chamas”, salientou Alfred sobre o Coringa no longa anterior. Dessa vez, a ambição do antagonista é maior. Ele quer ver o mundo pegar fogo, mas isso não tem como base somente a destruição. A necessidade de passar às pessoas de Gotham um discurso politizado a respeito do clichê (no lado positivo da palavra) “tempos desesperadores exigem atitudes drásticas”, é, inicialmente, o que move o vilão de Tom Hardy. E isso faz dele um personagem com ainda mais profundidade que o de Ledger.

Fisicamente superior e intelectualmente igual ao Batman, o Bane de Hardy é de uma presença que impressiona. Desde a voz assombrosa por conta da máscara que ameniza as dores que sente, até o porte muscular do ator, a presença do personagem em cena é um destaque que engrandece ainda mais o longa. A voz de Hardy soa impactante desde o primeiro momento, nos minutos iniciais do longa, quando o vemos em um avião durante uma espetacular sequência. Se em Ledger tínhamos o tique nervoso de lamber os lábios e as cicatrizes, em Hardy são os olhos injetados de ódio que chamam a atenção. Nada mais natural, uma vez que o ator, além de sua presença corporal, não teria, além de sua voz assombrosamente bem aplicada ao visual, nenhum outro modo de demonstrar o quão feliz foi Nolan ao escalá-lo para o papel. Além desse detalhe, é notável o desprezo que o assassino possui pelas pessoas que o cercam. Do seu modo de andar, seguro de si, segurando o colete que veste à forma como se refere ao Batman pelo seu nome verdadeiro, tudo na construção de Hardy denota o poder de Bane.

A trama se passa oito anos após os acontecimentos vistos no segundo filme. Gotham não possui mais o Batman. Recluso, Bruce Wayne sofre os danos sofridos pelo seu corpo nos tempos em que ainda era o herói e é visto pelo povo da cidade como um novo Howard Hughes. Com a chegada de Bane à cidade (“um homem nascido e criado no inferno”) com um plano de dominação que será executado de forma a tornar o povo os verdadeiros protagonistas do caos, o vilão já se diferencia da proposta anárquica e auto proclamada “sem planejamento” do Coringa. Dessa vez, a intenção é, além de fazer os cidadãos da cidade mostrarem suas verdadeiras faces, destruí-la até as fundações. Nesse ínterim, a história vai apresentar artifícios que incluem fusões nucleares, reviravoltas com referências a personagens anteriores e um discurso do vilão que é, desde já, um dos momentos mais brilhantes do longa.

Presença física: personagem capaz de destruir o Batman 
No quesito reviravoltas, Rises é insuperável. O filme consegue surpreender o espectador a partir da apresentação de personagens que cumprirão papéis chaves na trama. Além disso, ele amarra pontas soltas dos dois longas anteriores de modo a criar uma harmonia na história dos três, nos fazendo perceber as intenções de Nolan em trazer de volta certos detalhes envolvendo falas e atitudes de outros personagens da trilogia. E na inserção dos novos elementos humanos da história, o personagem John Blake (Gordon-Levitt), com sua história de vida semelhante a de Bruce Wayne e sua ascensão na força policial de Gotham, acaba sendo uma das melhores surpresas da obra.

O mesmo pode se dizer da Selina Kyle de Anne Hathaway, que cumpre a proposta de adequação à verossimilhança da realidade do roteiro de Nolan e aparece como uma ladra comum, que possui a única intenção de sobreviver. E se para isso ela precisar entregar certo personagem à ruína, ela o fará, mesmo que se arrependa depois. Sem contar que, claro, a atriz exala uma sexualidade ímpar, o que me leva a comentar sem nenhum pudor as belíssimas tomadas em que ela aparece pilotando a moto do Batman. Bravo, Anne, bravo.


Anne Hathaway, a Selina Kyle do mundo real: "apenas" uma ladra.
Um dos grandes acertos desse fechamento da trilogia reside no modo como Nolan tornou o Batman ainda mais humano que no segundo filme. Combalido, enfrentando sérios problemas de saúde e precisando contar com artifícios tecnológicos para melhorar sua condição física, Bruce Wayne é apresentado não como um super herói, mas como um ser humano que, como qualquer pessoa normal, teme o que terá que enfrentar. Dessa vez seu oponente não é uma pessoa que usa apenas o intelecto como arma de guerra. Dessa vez, seu oponente mescla de forma perfeita o físico com o intelectual. Bane é uma máquina perfeita. E Bruce sofrerá os piores danos por conta dessa união de força e inteligência. E friso: a sequência em que os rivais se encontram, desde seu inicio com a saudação de Bane para o “Sr. Wayne”, até o último golpe desferido, já figura entre um dos momentos mais simbólicos de uma adaptação de quadrinhos para o cinema.

Apesar de sobrecarregar um tanto o longa com as diversas subtramas apresentadas, o que acaba prejudicando o ritmo do filme em determinado momento, o roteiro dos irmãos Nolan apresenta uma conclusão nos faz esquecer desse detalhe. Para tanto, as atuações de Gary Oldman e de Michael Caine são as que mais se destacam. É um filme capaz de fazer com que o espectador experimente diversas emoções no decorrer dos 165 minutos. E fica a cargo do talento dramático de Caine as cenas em que a garganta dá um nó e é muito difícil segurar as lágrimas pelo que estamos presenciando.

Soberba atuação de Michael Caine representa os momentos de maior emoção
Após assistir na véspera os dois primeiros filmes da trilogia, o entendimento dessa conclusão torna-se mais natural. E é maravilhoso poder observar as rimas visuais que Nolan inseriu nos três filmes. Desde a repetição exata do momento em que Alfred consola a criança Bruce Wayne que se culpa pela morte dos pais até quando o adulto Bruce faz o mesmo pela perda de Rachel, passando pela hora chave quando vemos certo personagem cumprir o mesmo movimento entre os morcegos da Batcaverna. A elegância narrativa como Nolan insere essas situações nos três longas é de uma sutileza impar.

E se no primeiro Batman, a fotografia fazia questão de demonstrar-se dourada, representando o alvorecer de uma esperança e de um novo herói, no segundo, o azul constante das cores na tela já começavam a trazer a ideia de perda, de tristeza, algo que gradativamente vai se tornando negro (como é perceptível no combate final de Batman com Duas Caras).

Em O Cavaleiro das Trevas Ressurge, o diretor de fotografia Wally Pfister, parceiro habitual de Nolan, inseriu a cor preta, o frio, a chuva, como algo a representar a desesperança, a ruína de uma tragédia anunciada que transformará Gotham. Junto com essas cores, Hans Zimmer retorna com uma trilha sonora ainda mais tensa, que permite poucos (mas eficazes) momentos de silêncio do som diegético (da própria história) do filme. E se a montagem de Lee Smith não permite que certos momentos sejam mais sutis (como o olhar de certo personagem na última cena), as cenas de ação fazem jus à proposta de grandeza do diretor.

É, de fato, uma saga que fará falta. Agora que acabou, a pergunta que fica é a mesma que fiz em 2005 ao testemunhar Batman Begins: por que demorou tanto para alguém notar a potencialidade de um personagem como esse no cinema? Ainda bem que foi Christopher Nolan quem percebeu isso a tempo.

segunda-feira, 16 de julho de 2012

E essas salas 4DX e Macro X.E. que chegaram a Salvador?

Por João Paulo Barreto

Fotos: Divulgação
Sala  4DX. Observe os suportes p/ os pés e os encostos c/ equipamentos para borrifos
A convite da assessoria de imprensa do grupo Cinépolis, representada pela carismática Maria Fernanda Menezes e do crítico de cinema João Carlos Sampaio, o Película Virtual teve acesso às duas cerejas do bolo na inauguração do mais novo complexo da rede em Salvador BA: as salas 4DX e Macro X.E. 

Com um processo de tecnologia que impressiona, a primeira é um tipo de espetáculo onde o produto audiovisual é apenas um detalhe. Os verdadeiros astros para quem topar a sessão são os efeitos de complementação ao filme, que vão desde ventos, aromas, efeitos luminosos a borrifadas de água oriundas do encosto da poltrona da frente. Falar das poltronas é um caso à parte. Segundo o presidente do grupo Cinépolis no Brasil, Eduardo Acuña, cada uma delas chega a pesar trezentos quilos e foram instaladas no cinema em um processo “que lembrou a construção das pirâmides”, com rolamentos de madeira para levá-las até os locais mais distantes da tela até que cada uma estivesse fixada em seu local correto dentro da sala. Com suportes para os pés e uma total sincronia com os efeitos do filme, as poltronas fazem o espectador sentir as tremulações e interagir com as emoções que os personagens estão sentindo naquele momento. Durante a projeção, os movimentos de chacoalhar impressionaram.

No caso da sessão em que estive presente, a de A Era do Gelo 4, longa repleto de momentos em que os protagonistas se aventuram em quedas, voos e mergulhos, as poltronas nos faziam entrar no filme, causando um impacto maior do que o próprio 3D, proposto originalmente pelo longa. Obviamente, o alvo principal dessa novidade é o público infantil, que deverá curtir os efeitos do começo ao final da projeção. Os adultos (eu me incluo nessa leva), acabam perdendo o elemento surpresa da tal quarta dimensão após a primeira meia hora de filme. Não que seja um problema, uma vez que quem se aventurar com os filhos e (no meu caso) sobrinhos na sala, terá na contínua empolgação dos pequenos um plus para aproveitar ainda mais a sessão.

Acuña explicou que não serão todos os filmes que terão exibição na sala 4DX. Algo que, claro, já era previsível, uma vez que não são todas as obras com potencial para boa adaptação aos efeitos que o 4DX oferece. “Nós pretendemos relançar filmes como Os Vingadores, Avatar e Titantic na sala 4DX. No momento, além de A Era do Gelo 4, temos já adaptado à sala o longa Prometheus, de Ridley Scott ”, explicou o presidente. Após sair da sessão do mamute Manny, da preguiça Syd e do tigre Diego, percebi que esse tipo de tecnologia deveria ser implantada somente a filmes de apelo infantil e com 90 minutos, no máximo, de duração, uma vez que o impacto é perdido após certo tempo. Mas, friso, as crianças (verdadeiros alvos dessa nova demanda) vão querer ficar lá dentro por horas.

Tela com mais de 200 m² e som com alcance de até 13 mil watts e dois projetores 4 k: certeza de espetáculo em Salvador
No que se refere a cinema em sua essência, o verdadeiro motivo de empolgação da visita hoje foi a sala Macro X.E. Ao entrar no ambiente e se deparar com a tela de mais de 200 m² e a informação de que o sistema de som alcançaria a potência de 13 mil watts e com dois projetores 4k com absurdo alcance de nitidez, confesso que a 4DX ficou em segundo plano. A Macro X.E. (sigla para “extrema experiência”) promete se equiparar ao IMAX, cuja tecnologia já está presente em diversos cinemas do mundo. Acuña afirmou que só existem 30 salas de projeção com a tecnologia Macro X.E. no mundo, o que torna ainda mais surpreendente o fato de uma delas estar aqui em Salvador, no Shopping Bela Vista.

Perguntei ao presidente do grupo Cinépolis sobre as intenções da empresa no que tange às famigeradas projeções de filmes dublados. Claro, a pergunta já possuía um respaldo econômico, uma vez que é notório que o público vem preferindo as versões dubladas. Porém, preferi argumentar com o CEO que outros estabelecimentos, como o Cinemark, procuram manter salas exibindo sessões legendadas de forma integral. Segundo ele, o Cinépolis pretende respeitar seu público mantendo a vontade da maioria, porém, sempre haverá pelo menos uma sessão legendada. Observando o perfil do espectador de hoje em dia, não é muito difícil prever que a maioria das salas terão apenas sessões dubladas. A boa notícia é que, segundo Acuña, haverá sessões de filmes cults. E legendados.

O saldo final da visita foi positivo. Com nove salas 100% digitais e com a maior tela da cidade, a empolgação ao sair do complexo foi grande. Fica a expectativa para ver o Batman – O Cavaleiro das Trevas Ressurge possa ser testemunhado (sim, testemunhado!) na Macro X.D.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

O Espetacular Homem Aranha

(The Amazing Spider Man, EUA, 2012) Direção: Marc Webb. Com Andrew Garfield, Emma Stone, Rhys Ifans, Denis Leary, Martin Sheen, Sally Field.



Por João Paulo Barreto


Dez anos após o lançamento do primeiro filme da, até então, bem intencionada franquia do aracnídeo bancada pelo diretor Sam Raimi, Marc Webb (500 com ela) lança sua versão para origem de um dos mais adorados heróis das histórias em quadrinhos Marvel.

O Espetacular Homem Aranha possui, sim, mais erros que acertos. No entanto, tais erros não tornam o filme ruim. Arrisco-me a dizer que esse reboot da franquia acaba sendo mais orgânico que a estreia do cabeça de teia em 2002. Mais fiel aos quadrinhos, uma vez que insere os personagens da forma correta cronologicamente (Gwen Stacy como a colega de classe de Peter no lugar de Mary Jane; as pistas plantadas para o futuro de Parker como fotógrafo do Clarim Diário), essa primeira parte de uma possível trilogia mantém o ritmo da história sem solavancos no desenvolvimento, o que é um acerto.

Emma Stone como Gwen Stacy: perfeita caracterização
Enquanto que no primeiro Homem Aranha parecia haver certa pressa para a apresentação da história ao inserir ainda no arco inicial figuras como o editor J.J. Jameson, dessa vez o roteirista James Vanderbilt (de Zodíaco) em parceria com Alvin Sargent (veterano que já havia participado do roteiro de outros dois filmes do herói) e Steve Kloves (da série Harry Potter) preferiu tornar a narrativa mais fluída, valorizando o vasto material que possui e sabendo utilizar com parcimônia os elementos de um universo tão amplo como o do aracnídeo.

Dessa forma, o filme prefere valorizar mais a relação de Peter (Andrew Garfield) com os pais, inserindo-os como personagens que fazem parte das motivações do rapaz, algo que foi ignorado na franquia de Raimi. Assim, quando o jovem descobre pontos em comum entre o trabalho de cientista do seu falecido pai com os estudos do Dr. Curt Connors (Rhys Ifans) voltados para crescimentos de membros amputados, ele decide procurar o pesquisador para desvendar esse mistério em sua família. E, claro, será no laboratório da Oscorp (pista para o vilão do segundo filme) que Parker será picado pela aranha modificada geneticamente e desenvolverá os poderes que o farão assumir-se como herói.

Rhys Ifans: boa escolha de ator que não se refletiu no vilão digital
Dessa vez, as teias não são orgânicas, algo que o filme desenvolve de forma interessante para diferenciar-se da trilogia anterior. As cenas em que Peter treina em um galpão usando seu skate e correntes para se pendurar fazem a história mais fiel à realidade, tornando mais fácil a identificação do espectador com o protagonista. Outro ponto de acerto é o modo como o roteiro insere a adaptação de Peter aos novos poderes. Em duas cenas repletas de boas gags visuais, vemos o jovem acordar tanto em um vagão de metrô ao ser abordado por uma gangue, quanto em seu quarto sem ter como controlar a própria força e os reflexos, algo bem diferente do modo narcisista como Raimi preferiu apresentar o Parker com poderes de Tobey Maguire. No entanto, fica na memória a indefensável cena de videoclip com Peter brincando de skate.

Outro ponto positivo está na escolha de Andrew Garfield como protagonista. Mais carismático que seu antecessor, o jovem mantém um equilíbrio entre as cenas dramáticas que a vida trágica de seu personagem com o humor ácido e escapista que ele possui. Até mesmo a linguagem do adolescente é bem trabalhada. Repleta de gírias e tons de insegurança, as falas do Parker de Garfield são construídas de forma pertinente a um personagem que está lidando com muito mais que sua bagagem emocional pode suportar. E é no bom humor que ele foca sua saída.

Boa química em cena: Emma Stone e Andrew Garfield 
Com a agradável comédia romântica 500 dias com ela no currículo, era de se esperar que Webb trouxesse uma boa química ao romance entre o casal Peter e Gwen. Os diálogos de ambos nos momentos em que começam a criar certa intimidade são bem típicos da insegurança romântica dessa fase, tornando crível a construção da história dos dois. Porém, no mesmo quesito crível, não é em todos os aspectos que o diretor e roteiristas acertam. Apesar de se sair bem como o cientista Connors, Rhys Ifans viu a escolha do vilão Lagarto como antagonista do aracnídeo ser desperdiçada em uma caracterização digital falha, que não chega a causar a suposta repugnância que a criatura almeja passar, tornando o vilão caricato, sem o peso que o Dr. Octopus de Alfred Molina possuía no segundo filme de Raimi. E  a redenção do monstro não ajuda em nada.

Ainda nesse aspecto de mau desenvolvimento dos personagens, Martin Sheen e Sally Field fazem o que pode para trazer peso e carisma aos tios Ben e Mary, tutores de Peter Parker. No entanto, com o roteiro frouxo nesse âmbito da vida do futuro herói, nem mesmo o assassinato do homem que o criou é bem desenvolvido pelo trio de roteiristas, fazendo o acontecimento ter menos impacto que o merecido.

Como disse no começo do texto, o filme possui mais erros que acertos. Estes fazem sua parte e tornam essa reinauguração da franquia bem vinda. As cenas dos voos noturnos do aracnídeo por Nova York (algo salientado de modo excelente pela fotografia de John Schwartzman) e a previsão de ver na segunda parte dois um dos momentos mais emblemáticos dos quadrinhos (algo trágico envolvendo Gwen Stacy e o Duende Verde), torna O Espetacular Homem Aranha ainda mais emblemático. Nada mal após a nociva e repugnante terceira parte da franquia anterior.

Observação: Como já era de se esperar, a lenda Stan Lee faz sua ponta. A melhor de todas, friso.