quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Intocáveis

(Intouchables, FRA, 2012) Direção: Olivier Nakache e Eric Toledano. Com François Cluzet, Omar Sy, Anne Le Ny, Audrey Fleurot, Clotilde Mollet.



Por João Paulo Barreto

Intocáveis é uma versão mais leve de Mar Adentro. O filme dirigido pela dupla de cineastas Olivier Nakache e Eric Toledano (a partir de um roteiro escrito por eles mesmos e baseado em fatos reais), apesar de não possuir a carga de tristeza e discussão ética do filme de Javier Bardem, emociona e faz rir a partir da mesma premissa: a de que as coisas poderiam estar bem piores, então vamos rir para não deixá-las chegaram ao ponto de nos fazer chorar.

Vítima de um acidente de parapente (espécie de paraquedas planador), o milionário Philippe (Cluzet, sósia de Dustin Hoffman em certas cenas) é um tetraplégico que passa os dias em sua mansão sob os cuidados de uma equipe de criados especializada em mantê-lo confortável com sua deficiência. De massagens destinadas a manter a circulação sanguínea à alimentação ministrada como que a um bebê, o homem de meia idade passa os dias em um mundo culturalmente rico, mas onde se considera condenado a viver. Com os cuidados recebidos, ele afirma que poderá viver com essas limitações até a faixa dos 70 anos. Cansado da comiseração dos enfermeiros destinados a cuidar dele, Philippe resolve contratar Driss (Omar Sy), jovem de origem africana, ex-detento, que não demonstra nenhuma compaixão pelo estado dele e que só está na entrevista de trabalho para conseguir a assinatura que o permitirá renovar o seu seguro desemprego.

Driss traz para a vida de Philippe mais do que comiseração
Contando com uma química perfeita entre os protagonistas, Intocáveis acerta ao evitar trazer o foco da relação entre os dois para a melancolia sofrida por Philippe. Se seguisse por esse caminho, o filme fatalmente cairia em uma armadilha piegas que prejudicaria um roteiro que sabe oscilar de forma ideal entre o drama e a comédia. Essa comédia, alias, se deve justamente à já citada relação entre Driss e Philippe. Com destaque para as tiradas hilárias do primeiro em relação ao rebuscamento cultural do segundo, o filme tem nas coversas dos dois seus melhores momentos. Como quando Driss assiste a uma ópera em alemão e não consegue controlar seu riso ou quando, no aniversário de Philippe, é apresentado às diversas composições clássicas e diz conhecer Vivaldi por causa dos jingles telefônicos tocados nas chamadas de espera da Secretaria do Trabalho Francês.

Em outro ponto de acerto, a trama evita classificar Driss como alguém castigado pela vida. Claro, o homem é uma pessoa com antecedentes criminais, imigrante africano em solo francês; alguém cuja família composta por vários irmãos pequenos se acumulam em um apartamento minúsculo (a rima visual envolvendo a banheira da casa da família de Driss com a do seu cômodo privado na casa de Philippe é bem eficiente) e que a ausência constante para com a mãe adotiva a faz agir com abdicação à qualquer tipo de ajuda que ele queira oferecer agora. Porém, esses dramas pessoais são apenas apresentados pelo filme, sem a necessidade de um destaque maior. A verdadeira história do longa é a interação entre os dois protagonistas e a forma como um acaba influenciando de forma positiva a vida do outro.

Dependência mútua: a dupla acaba por criar uma amizade além do profissional
Clichês estão presentes, obviamente, mas o modo como são inseridos acabam por não criar um resultado negativo. Como no momento em que Driss afirma que não há forma de o convencerem a cumprir uma das funções exigidas nos cuidados para com Philippe. Na cena seguinte, lá está ele cumprindo a tal renegada função. Ou na relação entre Driss e os outros empregados da mansão de Philippe, algo que começa conturbada, mas que logo se torna amigável pela simpatia cativante do rapaz.

Quando os créditos finais sobem, a sensação de bem estar trazida por esse leve drama francês se perdura por um longo período. Talvez se deva ao fato da falta de pretensão desse longa. O peso da tragédia na vida do verdadeiro Philippe, que conhecemos no final do filme, se dissipa a partir da amizade entre esses dois homens. O peso da tragédia se perde como no momento em que Philippe volta a voar e convence Driss a fazer o mesmo. Ou quando ambos riem da forma que Philippe conseguiu de conseguir prazer sexual. A vida é uma só. Chega uma hora em que não é mais conveniente se lamentar. Trecho de livro de autoajuda, ok, mas ainda eficiente ao se observar a sensibilidade de uma obra como Intocáveis. 


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