quarta-feira, 25 de maio de 2016

Roteiro de Casamento

(Me Case com um Boludo, ARG, 2016) Direção: Juan Taratuto. Com Adrián Suar, Valeria Bertuccelli.


Por João Paulo Barreto

Em Roteiro de Casamento, há uma tentativa pífia de se construir uma crítica à hiper-exposição de celebridades na mídia do mesmo modo como tenta criar uma análise do quão nocivo é a idealização do romance em um relacionamento.

Propondo-se funcionar como uma comédia romântica, o filme consegue até criar bons momentos na interação entre os dois protagonistas, Fabián Brando, o ator de sucesso vivido por Adrián Suar, e a novata no oficio Florencia Córmik (Valéria Bertuccelli), principalmente nas cenas em que Fabián conta vantagem em suas experiências no cinema.

Fabian e Florencia: romance precipitado e idealizado
No entanto, ao insistir por muito tempo nas mesmas situações, o que parece sempre focar no choro descontrolado por parte de Florencia e na postura egocêntrica de Fabian (cuja mudança, sabe-se desde o começo, será a razão para sua redenção), o filme cansa em sua proposta de fazer rir.

Curiosamente, a história da atriz que se apaixona pelo personagem vivido por seu parceiro em cena e começa um relacionamento com o ator que o interpreta, até engata certo interesse quando aborda o modo como o ceder, a adaptação e o reconhecimento dos erros podem influenciar de modo construtivo a vida a dois. Mas, quando essa proposta é colocada em prática, o filme já esgotou a paciência do espectador em uma repetição de piadas baseadas nas mesmas muletas de atuação que os atores usam à exaustão nos 100 minutos de projeção.

Piadas carente de timing cômico
Para sermos justos, o longa até funciona em algumas de suas gags visuais, como o momento em que o galã vivido por Adrián Suar sai de seu trailer na chuva e segue sem se molhar em direção ao carro. Do mesmo modo, ainda em sua abordagem romântica, a ideia de usar o roteirista de cinema como conselheiro de Fabián quando este precisa de ajuda para se tornar o tal personagem pelo qual a esposa se apaixonou, acerta por levar um aspecto metalinguístico a um filme cuja banalidade de sua história o torna quase descartável.

Mas diante de tantas cenas forçadamente engraçadas e sem um necessário timing cômico para se sustentar, como na irritante cena da cegueira ao final, a paciência se esgota logo.

  

Jogo do Dinheiro

(Money Monster , EUA, 2016) Direção: Jodie Foster. Com George Clooney, Julia Roberts, 
Jack O´Connell, Giancarlo Esposito, Dominic West.


Por João Paulo Barreto

Em Jogo do Dinheiro, a diretora Jodie Foster consegue trazer de modo pertinente relevantes discussões acerca da selvageria desenfreada do mundo capitalista no mercado financeiro, além de focar incisivamente o universo midiático da televisão e sua não menos selvagem ação em busca de audiência.

Ao optar por um cenário no qual aparentemente não veremos redenção alguma para nenhum dos personagens envolvidos, a história surpreendentemente escrita pelos mesmos roteiristas por trás de banalidades como A Hora do Rush, A Lenda do Tesouro Perdido e Taxi (sim, aquele com a Gisele Bündchen), cria uma reflexão acerca da natureza pela busca sem limites por lucro, independente de quantos serão prejudicados em detrimento do saldo positivo de apenas um pequeno grupo de pessoas.

Aqui, temos uma pane sistêmica causando a perda de todo o capital investido em um fundo de ações da bolsa. Resultado: economias de milhares são perdidas da noite para o dia, num montante de 800 milhões de dólares. Nesse ínterim, Lee Gates (Clooney), o âncora extrovertido e falastrão de um programa que dá dicas financeiras (recomendando tal investimento, inclusive) tem seu show invadido por Kyle Budwell (O’Connell) que, armado e portando um colete de bombas, exige explicações para a perda de todo seu dinheiro aplicado em tal fundo.

Gates é confrontado por Budwell em busca de respostas
A partir dessa premissa, o filme busca criar um ambiente de tensão em torno de toda a situação, conseguindo esse intento inicialmente, mas falhando de forma pontual em determinados momentos na criação dessa atmosfera nervosa na interação entre os dois personagens, como quando a arma é deixada de modo artificial ao alcance do apresentador ou quando o estúdio começa a ser evacuado sem que o Budwell perceba.

Há, entretanto, um acerto na presença de Julia Roberts como a diretora do programa que continua sendo transmitido ao vivo por exigência do invasor. Com seu tom de voz calmo, refletindo sua longa experiência à frente da equipe, sua Patty Fenn acaba por ser um ponto de equilíbrio diante do histrionismo de O´Connell.  

Histrionismo este que até se justifica por conta do arco relacionado ao personagem, o que é muito bem demonstrado pela impactante cena em que ele se vê diante da namorada grávida, em um momento cujo constrangimento do homem desesperado perante as duras palavras da garota atinge, também, o espectador.

Julia Roberts no papel da diretora do programa Money Monster
A despeito da complexidade relativa às questões técnica do mundo financeiro, um dos trunfos na execução da trama está em conseguir exprimir para o espectador essa tecnicidade dos aspectos econômicos por trás dos fatos. Não é somente uma questão de “o dinheiro que estava aqui sumiu por conta de uma pane”, mas toda uma análise relacionada a algoritmos e impossibilidades matemáticas que o filme traduz de modo eficiente, tornando, apesar de certos diálogos expositivos, crível e compreensível ao público.

Trata-se de um filme que busca trazer uma reflexão acerca das vitimas deste sistema. Do modo como a busca insana por dividendos sobrepõe qualquer tipo de ética.  E é somente em uma situação de caos, somente quando a sensação de perda é levada, também, para o topo da pirâmide, que se torna perceptível o quão animalesco é o supostamente civilizado mundo corporativo.

Não é surpresa que, ao final, o único realmente prejudicado em toda a história seja justamente o que já a começou sem esperanças. Ao vermos diretora e âncora planejarem o próximo programa antes mesmo de a poeira baixar, percebemos como as vitimas deste universo serão sempre as mesmas. 

Corrigindo uma observação feita no começo desse texto, a redenção pode até chegar, mas os que a receberão serão os mesmos a sempre lucrar com a desgraça alheia.

A corda só se parte para o lado mais fraco, de fato.




segunda-feira, 23 de maio de 2016

A Garota do Livro

(The Girl in the Book, EUA, 2016) Direção: Marya Cohn. Com Emily VanCamp, Michael Nyqvist, Ana Mulvoy-Ten. 


Por João Paulo Barreto

Existe uma análise bem relevante proposta por A Garota do Livro. Tal ideia está na premissa que filme tenta levar à frente ao iniciar uma discussão acerca dos traumas psicológicos que a pedofilia, o abuso de vulneráveis e, tão grave quanto, a ausência familiar em tais situações podem causar.

No entanto, talvez por preguiça da roteirista e diretora Marya Cohn, tal tentativa de apresentar em seu filme algo que fugisse do banal e raso ciclo do “1) apaixonar-se; 2) pisar na bola; 3) perder a pessoa amada; 4) consequente fossa; 5) luta pela reconquista; 6) previsível final feliz” acaba ficando em segundo plano justamente por essa proposta simplista com a qual o público se depara no desenvolvimento da trama.

Curiosamente, é justamente por perceber sua possível profundidade que a história da agente literária Alice Harvey (VanCamp) capta um pouco da atenção do espectador. Filha de um editor de livros de sucesso, a jovem é estimulada desde cedo a dar vazão à sua veia de escritora. Quando Milan Daneker (Nyqvist), um dos autores agenciados por seu pai passa a servir como tutor intelectual no desenvolvimento de sua escrita, fica óbvio que o interesse do escritor naquela relação passará a ser um pouco mais do que avaliar os textos da bela adolescente de dezesseis anos.

Predador e caça: Daneker manipula os sentimentos de Alice para ter material
E o filme até ameaça construir de modo pertinente a situação, colocando ambos em um visível desconforto diante dos sentimentos que começam a aflorar, em uma clara tentativa de não rotular vilão e vitima naquele enlace. Claro que, pela própria natureza do fato e pela repulsiva manipulação que se descobre existir por trás das ações de Daneker, qualquer empatia nesse desenvolvimento se torna impossível, principalmente ao conhecermos as consequências psicológicas que aquela relação trouxe para a vida da jovem.

Já adulta, inclusive, Alice acaba por se ver agindo na mesma posição de seu agressor, quando seduz um adolescente. Tal fato, de certo modo, corrobora a ideia de que, em algum ponto, o roteiro de A Garota do Livro tentou elaborar uma discussão mais contundente a respeito dos traumas relacionados à sua premissa, mas a preferência por tornar o longa maleável e adocicado para a audiência tornou mais atrativa para a diretora toda a fraca trama secundária abordando a reconquista do namorado traído no gesto impulsivo de Alice.

Alice e o começo da superação de seu trauma

Mas até que valeu a pena por podermos confirmar que crescer é, de fato, um termo bem subjetivo, ainda mais quando vemos a protagonista criar um blog do tipo “100 razões para você me perdoar” e colocar como uma dessas razões a ideia de que ela, agora, “está pronta para crescer”.

Tal ação confirma bem esse fato. E qualquer percepção de profundidade naquela história caiu por terra em algum momento dos incrivelmente longos 86 minutos de projeção.


sexta-feira, 20 de maio de 2016

X-Men: Apocalipse

(X-Men: Apocalypse, EUA, 2016) Direção: Bryan Singer. Com James McAvoy, Michael Fassbender, Jennifer Lawrence, Nicholas Hoult, Oscar Isaac. 


Por João Paulo Barreto

Existe um fator emocional que sempre funciona bem nos filmes dos X-Men. Independente dos cineastas, seja Bryan Singer, Brett Ratner ou Matthew Vaughn que ocupem a função de diretor dos exemplares da franquia, dentre acertos e erros cometidos na criação dos longas, há algo sempre acima da média: o modo como os personagens conseguem se interligar emocionalmente e a forma eficiente como os realizadores constroem isso para o público.

Mesmo com um resultado final abaixo dos dois filmes anteriores, First Class e Dias de um Futuro Esquecido, X-Men: Apocalipse erra pouco. E, o mais importante, seus acertos acabam por suplantar possíveis equívocos que encontramos aqui e ali durante os 144 minutos de projeção. Dentre os acertos, justamente a citada força de sua história ao trabalhar bem a ligação emocional de seus personagens.

Aqui, vemos novamente a tragicidade da vida Eric Lehnsherr, o Magneto, cumprir boa parte da carga dramática que sustenta o roteiro do longa. Na perda dos seus entes mais queridos, algo que já vimos de modo semelhante no primeiro exemplar da nova trilogia, e na descoberta desse fato pelo seu amigo Charles Xavier, é onde está, em Apocalipse, a principal relevância do filme. E nas boas atuações de James McAvoy e Michael Fassbender, seu maior trunfo.

Eric Lehnsherr revive a dor da perda que definirá suas escolhas
Da mesma forma como vimos os dois personagens encontrarem um elo em uma bela cena de First Class, quando um compartilhamento de lembranças é genuinamente agradecido entre lágrimas pelo professor X, aqui, ao adentrar na mente do amigo e perceber que uma nova tragédia se fez em sua vida, uma sincera demonstração de pesar é trazida à tona pelo mutante telepata. Assim, o diretor Bryan Singer acerta no tom dramático de sua história, algo que vemos novamente em outros momentos chave da trama. 

Na história, o Apocalipse do título, no caso o primeiro mutante a surgir na terra, no antigo Egito, acorda de seu sono após ter sofrido a interrupção do processo que o transformaria no regente do planeta. Milênios se passam e seu ressurgimento coincide com o momento em que os mutantes possuem uma boa relação com os humanos, uma vez que foram os mesmos que impediram o assassinato do presidente Nixon.

Com uma voz impactante e presença soturna e misteriosa, Oscar Isaac até consegue realizar um bom trabalho na criação de seu vilão. No entanto, toda sua participação soa um tanto deslocada, quase carnavalesca, diante da proposta de ambientação séria e (até certo ponto) calcada na realidade que os dois longas anteriores optaram por inserir.

Apocalipse e sua presença carnavalesca
Esse ponto é perceptível, por exemplo, quando vemos o personagem em locais como Auschwitz ou mesmo na metalúrgica onde o Eric tenta se esconder: a presença burlesca daqueles mutantes específicos se desloca um pouco da trama. Não à toa, o filme funciona bem melhor quando não está trabalhando na criação de seu arco, o que nota-se quando o roteiro opta por desenvolver a história da motivação do luto de Magneto, a captura dos mutantes pelo coronel Stryker e, claro, a impressionante e sangrenta participação de Wolverine, algo que, por si só, já vale filme inteiro. 

Trazendo de volta ideias que funcionaram bem no longa anterior, como a ação do veloz Mercúrio exibida em câmera lenta, aqui, essa utilização, apesar de divertida, soa deslocada não somente pelo uso de uma trilha sonora divergente do momento dramático que a perda de um personagem central pediria, mas, também, por soar como uma muleta para o roteiro. Não à toa, a descoberta de tal perda perde seu impacto emocional quando trazida à tona logo em seguida ao termino da sequência do mutante velocista.

Ao final, a sensação é justamente a de um filme que funciona bem no já citado elo emocional que liga seus personagens, apesar de ter dado um passo atrás ao optar por um vilão simplório e convencional (e vê-lo como designer de uniformes, de fato, não ajuda muito na sua credibilidade) ao invés de se aprofundar em outras questões que o drama mutante pode oferecer.

Mas nada que uma nova trilogia não possa resolver.