domingo, 19 de agosto de 2012

E Agora, Onde Vamos?

(Et Maintenant on va où?, França, Líbano, 2011) Direção: Nadine Labaki. Com Claude Baz Moussawbba, Leyla Hakim, Nadine Labaki.


Uma discussão religiosa envolvendo cristãos e mulçumanos através da óptica de mulheres que precisam conter os acessos de intolerância dos maridos residentes de um vilarejo do Líbano. Música, dança, tensão, risos e lágrimas. Soa clichê a combinação desses elementos, mas o resultado é pra lá de original. Desde os momentos iniciais de E Agora, Onde Vamos?, segundo filme da diretora e atriz Nadine Labaki, já se percebe que o lúdico fará parte do modo de contar essa tensa história. Porém, será através de dramas muito reais e impactantes que os traumas da violência oriunda da religião serão demonstrados.


É pertinente o modo como a diretora e roteirista (uma das cinco, na verdade) insere no filme esses momentos de pausas lúdicas, nos quais os personagens cantam entre si como em um musical ou dançam em uma espécie de transe enquanto seguem para o trabalho de limpar as sepulturas do cemitério onde os mortos são enterrados de acordo com suas crenças. A impressão que se tem é a de que a lógica para um mundo de tamanha tensão por conta das diferenças religiosas exige certo desprendimento poético por parte de quem o habita.

A dança lúdica esconde a dor da perda
Curiosamente, apesar da intensa carga dramática, a história apresenta uma leveza e humor impares. Com subtramas que remetem a Cinema Paradiso, nas quais o esforço coletivo dos habitantes da vila em se reunir no único ponto do lugar onde a recepção do sinal de TV é possível, o espectador passa a se familiarizar com os dramas pessoais de cada uma daquelas pessoas. Isolados do mundo, eles conhecem os fatos a partir das reuniões públicas em frente à tela de imagem ruim, na qual brigam para sintonizar canais de interesse comum e são censurados pelos mais velhos quando a programação exibe qualquer traço se sexualidade.

Em um universo tão restrito, a religião é a única coisa que tais pessoas têm para se apoiar. O senso comum de cada uma delas é galgado nesse pilar frágil. E essa fragilidade é facilmente quebrada tornando a intolerância evidente. Então, quando as mulheres da vila veem os cristãos e os mulçumanos perderem a calma entre si a ponto de agredirem crianças, percebem que a manipulação de todos é a resposta para evitar tragédias previsíveis. Labaki exibe com uma sutileza palpável como a inutilidade da religião é evidente. Obviamente, o filme não se baseia nesse julgamento para com as crenças, mas a interpretação da obra pelo espectador atento permite esse aprofundamento dos temas ditos sagrados e a conclusão desse fato.

Música, dança e bolinhos "batizados": solução para acabar com a violência
A partir do momento em que vemos a manipulação simples de mulheres temerosas pelo resultado das rixas de diferentes credos entre os homens do local, percebe-se a nulidade dos dogmas. Afinal, bastaram um pouco de haxixe, algumas garotas dançando e uma dose de boa música para que a violência fosse sobreposta pela camaradagem de bêbados. A morte de um dos seus filhos, cujo corpo acabou tendo que ser escondido por uma mãe que não pôde se entregar ao luto por conta do medo que a divulgação daquela morte viesse a ampliar ainda mais a violência, serviu de lição para aqueles que trazem para si a ideia de que o próprio “deus” (sim, em minúsculo) é melhor que o do vizinho.

A pergunta “E agora, onde vamos?” proferida na última cena continuará sem resposta enquanto a religião mover um mundo repleto de homens cegos e violentos. 

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