segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Match Point

(Idem, Inglaterra, 2005) Direção: Woody Allen. Com: Jonathan Rhys-Meyers, Scarlett Johansson, Emily Mortimer, Brian Cox, Matthew Goode, Penelope Wilton.



Tido pelo próprio diretor como sendo seu melhor trabalho, Match Point, de Woody Allen, pode não ser, realmente, o maior êxito cinematográfico do cineasta americano, mas é o mais conciso e surpreendente. Narra a história de Chris Wilton (Rhys-Meyers), um fracassado jogador profissional de tênis que decide tentar a vida dando aulas do esporte em um sofisticado clube londrino. Frequentado pela alta sociedade inglesa, o lugar é o local perfeito para Wilton conseguir sua almejada chance de mudar de vida: ele é um golpista que pretende se infiltrar entre os ricos para, assim, conseguir deixar a vida pobre conquistando alguma herdeira milionária.

Um dos melhores personagens já criados por Woody Allen, Chris Wilton é apresentado no longa não como um calculista disposto a subir na vida de qualquer forma. O diretor prefere exibi-lo de forma natural, galgando seus passos de ascensão e mostrando seus interesses não de modo vilanesco, mas, apenas, ambicioso. Algo típico e razoável para qualquer pessoa que tenta a vida em outro país, afinal, Wilton vem da Irlanda, país cuja população não possui a melhor das relações com os londrinos.  Desse modo, mesmo percebendo as atitudes do personagem, o espectador não o antipatiza justamente pelo fato de Allen não o classificar de modo caricato, como sendo alguém sem escrúpulos que apenas quer se dar bem na vida.

Sendo assim, o inicialmente ambicioso (e apenas isso) Chris, conhece a família Hewett através de seu herdeiro, Tom, um playboy desocupado que passa os dias jogando tênis, bebendo e freqüentado festas. A Dolce Vita de Tom, óbvio, logo cativa Chris. Ambos têm muito em comum. Amam arte de modo sincero e a consomem de modo voraz. Logo ao perceber que Chris também se interessa por óperas, Tom o convida para um espetáculo onde estará seus pais e sua irmã, a bela Chloe (Emily Mortimer), que, no mesmo momento, se apaixona pelo rapaz. Criada de modo aristocrático e subserviente, Chloe é justamente a meta principal de Chris, uma vez que tem planos de se casar (“Quero ter três filhos. E os quero ainda jovem”) e, desde já, se esforça para inserir Chris no meio social e empregatício de seu pai, Alec Hewett (Brian Cox), que acolhe o rapaz como se fosse seu próprio filho.

Com Chloe, o ambicioso Chris encontra o luxo que sempre almejou 


Tudo caminha perfeitamente bem para Chris. Todos os planos deram certo. Ele não mais ensina tênis em troca de um salário mínimo, não mais mora em um minúsculo apartamento pagando uma fortuna de aluguel por semana e não mais precisa se preocupar com a ideia de ser um derrotado na carreira de tenista. No entanto, no circulo familiar do Hewett, Chris se apaixona não por Chloe, mas pela exuberante Nola (Scarlett Johansson), noiva de seu cunhado, Tom.

Durante diversos momentos, Woody brinca com metáforas relacionando o jogo de tênis com a ideia de sorte na vida, desejo e paixão No primeiro encontro de Chris e Nola, um diálogo inspirado de Allen referencia o jogo de tênis de mesa usando-o como uma metáfora para toda aquela energia sedutora e catártica que representará aquela relação. Em uma brilhante cena, Nola fala que estava indo bem até Chris aparecer, se referindo ao jogo de ping pong. E acrescenta que ele joga de modo bem agressivo. Rever esse diálogo já conhecendo a história do filme leva o espectador a um deleite, uma vez que se percebe como Allen mantém cada linha de sua narrativa sem pontas soltas.

Chris conhece Nola em uma estupenda cena de Woody Allen
É inevitável para Chris se apaixonar por Nola. O que é proibido acaba sendo bem mais prazeroso, como já era de se esperar. Mais centrada e consciente do que ele (como culpá-lo? O cara pensa com outra cabeça), Nola lhe dá os melhores conselhos, dizendo que ele vai se dar bem naquele ambiente aristocrático se não estragar tudo flertando com ela. Mesmo tendo conseguido tudo que almejava (dinheiro, luxo, um bom emprego, um futuro promissor), Chris não consegue se manter afastado de Nola. Sua relação com Chloe torna-se mecânica, enquanto que, com a outra, sua paixão parece ter uma válvula de escape. E Allen não perde a chance de inserir aqueles momentos cômicos quase imperceptíveis que já fazem parte de sua filmografia, como na hilária cena em que Chloe mede sua temperatura antes de transar com Chris. Nada melhor para destruir um momento sensual.

Utilizando uma trilha sonora condizente com a tragédia que o filme apresenta, Woody Allen traz óperas que casam de modo ideal ao ambiente londrino. Além disso, ele insere na história breves dicas para o que está por vir, como o fato de Chris ler Crime e Castigo, de Dostoievsk e, de modo tragicômico, investe nas falas que salientam o sombrio destino de Wilton, como quando este pratica tiro ao alvo com o sogro e o ouve dizer que ele o transformará em um exímio atirador.

Chris prestes a cometer o ato que definirá sua vida

Apresentando-se como uma brilhante metáfora para a sorte e como um homem consegue construí-la de modo calculista, não é de se estranhar que Woody Allen considere Match Point seu melhor longa. Com um equilíbrio ideal entre a tragicomédia e o drama, o diretor realizou uma obra notável que choca de modo, ao mesmo tempo, arrebatador e sutil. É a história de um homem que não mede esforços para conseguir o que quer, mesmo que seja assombrado por sua consciência até o final da vida.

O diálogo entre Chris e duas personagens durante uma madrugada insone em sua cozinha representa bem isso.  


3 comentários:

  1. Pra mim, esse é dos melhores filmes do Allen dos últimos anos. Incrível como ele emula um próprio filme dele antigo, Crimes e Pecados, para contar a mesma história de relações que chegam a um limite tal que é preciso tomar atitudes drásticas para desfazê-lo. Só que aqui existe o fator sorte, que Allen defende como elemento essencial da vida de qualquer pessoa. Essa pra mim é a grande "tese" do filme. Fora isso, tem uma precisão das cenas, os diálogos cortantes, a tensão em crescendo e, claro, a beleza, volúpia e perigo contidos em Scarlett Johansson, seu melhor papel e atuação ever. Filmaço!

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  2. Aliás, nem comentei a revigorada na cara do blog. Ficou show!

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  3. Disse tudo, Rafa. Um dos melhores momentos de Woody Alen. Bem observada a referência a Crimes e Pecados, sendo que o fator sorte é utilizado aqui como ponto principal do roteiro. O modo como ele constrói a culpa de Chris é atordoante, também. Ele chorando dentro do carro após perceber o que acabou de fazer, pqp, torturante. Sem contar, claro, o diálogo durante a madrugada. Filmaço.

    Quanto ao blog, ainda estou reformulando. Uma amiga designer tá bolando algumas ilustrações pro cabeçalho. Ah, cria uma logomarca pro Moviola, pra eu colocar aqui do lado junto com a do Cabine.

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