sexta-feira, 29 de junho de 2012

Para Roma Com Amor

(To Rome With Love, EUA, ITA, ESP, 2012) Direção: Woody Allen. Com Allen, Jesse Eisenberg, Penélope Cruz, Ellen Page, Alec Baldwin, Roberto Benigni, Alessandra Mastronardi.


Para um cineasta que costuma lançar um filme por ano desde os anos 1970, não é incomum que em algum momento ele venha a errar a mão. Nos anos 2000, Woody Allen acertou bem mais que errou. Lançou aquele que ele mesmo considera seu maior êxito (Match Point), voltou a ganhar um Oscar depois de mais de vinte anos (a última vez que ganhou foi em 1987, pelo roteiro de Hanna e Suas Irmãs), porém entregou trabalhos pouco inspirados como O Escorpião de Jade, Trapaceiros e Scoop.

Com sua ida à Europa, o cineasta trouxe, de fato, um novo fôlego à sua filmografia com o já citado Match Point, o excelente Vick, Cristina Barcelona e o soberbo Meia noite em Paria, pelo qual foi agraciado com o quarto prêmio da academia em sua carreira (ele ir lá receber é que são outros quinhentos...). Algo em comum que todos os seus trabalhos europeus têm é uma aura de homenagem à cidade que serve de locação. Ao partir para Roma, a cidade eterna, o comportamento não poderia ser diverso. Porém, diferente dos filmes feitos na França e na Espanha, Allen acabou perdendo o vigor de sua história ao inserir muitos personagens em uma trama episódica e nonsense.

Milly e Antonio chegam a Roma sem imaginar o que os aguarda
Dois desses são o casal Milly e Antonio, que chegam à cidade para que a garota conheça seus sogros. O acaso acaba fazendo com que ela se perca e o jovem, abordado por uma prostituta em seu quarto (Penélope Cruz assumindo de vez a postura de musa sexual do diretor), passará pelas básicas situações de comédia para explicar quem é aquela mulher. Nas cenas em que o roteiro foca em Antonio e sua família, percebe-se certa preguiça de Allen ao inserir gags visuais batidas (como a de um personagem que inclina tanto a cadeira para trás e acaba caindo) ou a piada pronta de alguém que pergunta, em frente a uma prostituta, como será que deve ser trabalhar deitado de costas.

O “Woody Allen” da vez é o ator Jesse Eisenberg, que interpreta Jack, um estudante de arquitetura que se apaixona pela amiga de sua namorada. O rapaz até se sai bem ao recriar os maneirismos neuróticos dos papeis vividos pelo diretor, não se entregando demais às marcas registradas do original, o que gera uma identidade ao seu personagem. Mas em um filme onde o próprio atua, é impossível não compará-los. Seu objeto de desejo, Monica (Ellen Page), uma atriz que passa por uma crise profissional, segue a cartilha de diversas personagens femininas já criadas por Allen: insegura, falastrona, culta (cita uma frase de algum autor famoso a cada cinco sentenças proferidas) e inclinada ao sexo culpado.

A consciência Alec Baldwin observa (e reprova) o ato de Jack e Mônica
Semelhante ao que fez em Desconstruindo Harry, o diretor brinca de inserir uma consciência personificada em seu elenco. Aqui, John (Alec Baldwin), um arquiteto renomado, mas que “se vendeu” e hoje projeta shoppings, assume esse papel. Mais precisamente, ele se torna a consciência de Jack, dialogando com o rapaz enquanto este se corrói na dúvida se deve ou não investir na amiga de sua namorada. Curiosamente, Allen brinca com esse artifício narrativo, quebrando a barreira do personagem de John na trama, tornando-o capaz de fazer parte da consciência de outros, algo que esconde um propósito ainda inteligente: seria Jack uma representação do passado de John, uma vez que o arquiteto vaga por Roma com claros sinais de nostalgia dos tempos da juventude na cidade? Sendo Jack e John nomes tão similares (às vezes, apelidos um do outro), não seria surpresa ser essa a intenção do diretor.

Diante de tantas pessoas que entram em cena sem ter muito o que dizer, o diretor acaba encontrando uma solução para justificar (não muito bem) os erros do filme: o nonsense. Em uma pertinente crítica à glamorização de anônimos inúteis (em tempos de reallity shows, estava demorando para Woody abordar esse tema), ele insere Leopoldo (Roberto Benigni, sempre o mesmo), um trabalhador comum e anônimo que se vê perseguido pela imprensa e por papparazzi interessados em captar momentos rotineiros do homem, como o que ele come no desjejum, como se barbeia, dorme ou sua opinião sobre o tempo. Essa é a parte realmente interessante do longa, quando nota-se que Allen quer inserir algo a se discutir no filme. E o modo como se resolve o arco da vida de Leopoldo é uma forma de perceber como o circulo vicioso da já citada glamorização se estabelece como algo comum na atualidade.

Leopoldo se aproveita dos benefícios da fama sem razão
Já o cantor de ópera do chuveiro que o personagem interpretado pelo próprio Allen insiste em lançar no show business é, sim, o principal aspecto nonsense da trama. Vê-lo nos palcos europeus a cantar em um box era como assistir a um sketch do Monty Python.

Ainda que contando com boas tiradas (as que Woody reservou para si e para o papel de sua mulher no filme são as melhores), o filme acaba por não ter uma unidade narrativa, contando diversas tramas em paralelo, mas sem inovar em nenhuma delas.

Se como homenagem a Roma o longa se sai bem (as cenas gravadas nas ruínas e as imagens do centro da cidade são realmente de se encher os olhos), como uma boa história Woody ficou devendo dessa vez.

Ainda bem que no próximo ano ele terá mais uma chance.  


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