sexta-feira, 9 de março de 2012

Pina

Pina (Alemanha, França, UK, 2011) Direção: Wim Wenders. Com Regina Advento, Malou Airaudo, Ruth Amarante, Rainer Behr, Andrey Berezin, Damiano Ottavio Bigi.


No mesmo ano, os brasileiros foram agraciados com duas das melhores utilizações da tecnologia 3D que dois dos cineastas mais consagrados do mundo trouxeram para o cinema. A primeira, Hugo, dirigida por Martin Scorsese, inovou por conseguir aplicar a terceira dimensão de modo não gratuito, como em várias produções desde a popularização dessa tecnologia na década passada. O cineasta, de forma inteligente, percebeu que o 3D necessitaria de muita profundidade de campo para se fazer presente de forma ideal. O outro diretor a estrear nesse segmento é Wim Wenders, que trouxe para o 3D o primeiro filme-conceito da dança artística.

Pina é um tributo à alemã Philippine Bausch, ou apenas Pina Bausch, coreografa, dançarina e diretora da companhia Tanztheater Wuppertal, falecida subitamente em 2009, ocasião em que, em parceria com Wenders, organizava um documentário ilustrando o balé que dirigia. Com a inesperada morte de Pina, o diretor alemão precisou modificar a ideia central do documentário, mas declarou que a manteve do modo como havia imaginado junto a bailarina. O resultado acabou sendo um magnífico trabalho em homenagem a uma mulher que dedicou a vida à dança e modernizou o balé contemporâneo ao utilizar influências da vida dos próprios dançarinos na criação das coreografias.

A beleza do filme encanta e se valoriza pelo inteligente uso do 3D
Pina, o filme, mostra-se tecnicamente indefectível no conceito que Wenders almejou alcançar. Desde o primeiro momento do filme, quando somos apresentados a cidade de Wuppertal, na Alemanha, e ao local onde a companhia de dança realiza seus números, percebe-se o cuidado do diretor em explorar a profundidade de campo de seus takes de modo a valorizá-los ainda mais por conta do 3D. A presença dos dançarinos no palco torna-se ainda mais impactante. Logo no número inicial, The Rite of Spring, quando a questão da sexualidade é apresentada de modo simbólico e elegante, vê-se os dançarinos encenando o desejo carnal através de respirações ofegantes e do pertinente uso da cor vermelha para representar a libido. O modo como a movimentação da câmera através de travelings parece fazê-la dançar com os corpos dos dançarinos, juntamente com o 3D, tende a querer nos colocar no palco junto a eles.

O filme, também, trabalha de modo interessante as fusões de dentro para fora do palco e vice versa, como no momento em que uma das dançarinas possui o mesmo movimento em diferentes ambientes, tornando elegante o modo como o montador Toni Froschhammer resolveu unir as duas cenas a partir de um peça do figurino do espetáculo. No entanto, é a imaginação de Wenders que surpreende ao utilizar trucagens aparentemente simples de imagem para brincar com o espectador: vide a cena onde o corpo delicado de uma das dançarinas é confundido com o de um musculoso colega de dança. Ou até mesmo a bela referência à passagem do tempo que o número Kontakthof traz, com diversos bailarinos em diferentes faixas etárias que são confundidos em cena com versões mais velhas ou mais novas de si mesmos graças ao eficaz trabalho de montagem e à utilização de diversas câmeras.

O equilíbrio humano é sutilmente trabalhado pelas coreografias 

Fugindo de forma intrigante da fórmula “cabeças falantes” que diversos documentários trazem em sua estrutura, Pina apresenta vários dançarinos da companhia trazendo suas impressões de sua falecida mentora através de expressões faciais e depoimentos em voz over. É surpreendente como, sem apelar para excessivas utilizações de imagens de arquivo ou depoimentos da própria Pina, conseguimos construir a personalidade da mulher idealizadora daquele balé. E é realmente triste perceber a falta que ela faz aos seus discípulos.

Ao final, a reflexão sobre a frase símbolo de Pina Bausch, “Dance dance, otherwise we are lost” é a de que é bem mais recompensador ser feliz através da própria arte e da dedicação que ela exige. 

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