sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Nénette

(idem, França, 2010) Direção: Nicolas Philibert.


A contemplação do ambiente se faz presente na maioria dos documentários dirigidos por Nicolas Philibert. Em seus filmes, há um convite ao espectador para que este examine as imagens que a lente do diretor apresenta de modo atento, reflexivo. Seus filmes trazem uma introspecção que exige do espectador uma especial observação. Seja ela dirigida ao estudo de personagens (como é o caso de O País dos Surdos e O Mínimo das Coisas) ou a ambientes específicos, como o Louvre em Cidade Louvre ou o Museu de Arte Natural, em Um animal, Os Animais.
Em Nénette, mais recente trabalho do diretor francês, essa contemplação é bilateral. A história da orangotango de mesmo nome que vive no zoológico Jardin des Plantes, em Paris, há quarenta anos, é apresentada através de contemplativas e quase estáticas imagens do animal em seu dia-a-dia. Enquanto isso, o público a observa através do vitral, mas sem nunca ser captado pela câmera do diretor. São os diálogos em voz off dos visitantes do zoo que constroem uma narrativa ao mesmo tempo informativa e inquiridora. As crianças perguntam do seu jeito simplório sobre Nénette e suas questões acabam nos fazendo refletir a respeito do animal. São indagações simples sobre qual a idade dela (“ela tem a idade de seu pai, querido. Quarenta anos” e a criança replica “Mas o papai tem quarenta e meio, mamãe”), o que ela come, quem são seus filhotes. E há outra narrativa, essa totalmente informativa e ilustrativa.
Nesse segundo aspecto, ficamos sabendo a partir dos tratadores que a orangotango possui uma dieta da qual faz parte chás, iogurte e frutas. Há também explicações acerca do comportamento do animal junto a pessoas que cuidam dela. Um dos tratadores explica estar com Nénette há oito anos e só nos últimos dois foi que ela permitiu uma maior aproximação. “Os tratadores nunca a tocam sem que ela venha a pedir por isso”, comenta um dos funcionários do Zoo. É sempre ela quem deve procurar qualquer contato humano. Uma das criadoras observa que em certa ocasião Nénette a viu passando batom e, quando entrou no mesmo recinto, a orangotango mexeu em sua bolsa e pegou o batom para passar em si mesma, em uma prova direta da inteligência avançada do animal.

A sempre indiferente e blasé Nénette: nada mais natural.
Ao optar por exibir Nénette em um estado sempre indiferente enquanto as pessoas a observam, o filme levanta a óbvia reflexão sobre a ideia de que quem estará observando quem? Por isso a proposta de bilateralidade do longa, uma vez que a contemplação também parte de Nénette  Alguns visitantes costumam ir vê-la de modo rotineiro, como se estivessem visitando um parente preso ou algo semelhante. Desse modo, a reflexão que fica é a análise de um animal solitário, que passa seus dias observando pessoas ainda mais solitárias. Apesar dessa ideia, a orangotango não vive sozinha na sua jaula. Há seus filhotes Tübo e Tamu, e o macho adulto Théodore. Em certo momento, ouvimos um dos criadores dizer que, para não haver riscos de Nénette emprenhar de um dos seus filhotes, os veterinários lhes dão anticoncepcionais misturados ao seu iogurte.
Nénette é, como define bem um dos criadores, uma vítima de sua própria raridade. E por essa razão, acaba por refletir com seu olhar tedioso uma indiferença a todos os que param em frente ao seu lar. “Se o vidro quebrasse, seria um salve-se quem puder. E não mais ‘minha querida Nénette’”, observa o veterinário.
Pertinente manter sempre isso em mente ao julgar os animais como meras peças de observação dentro de vitrines. 




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