sexta-feira, 21 de outubro de 2016

O Mestre dos Gênios

(Genius, EUA, 2016) Direção: Michael Grandage. Com Colin Firth, Jude Law, Nicole Kidman, Laura Linney, Dominic West.


Por João Paulo Barreto

Dentro de uma reconstrução histórica impecável, Mestre dos Gênios, filme de estreia do diretor Michael Grandage surpreende pelo modo intimista como o cineasta conseguiu, já em seu primeiro trabalho atrás das câmeras, uma ótima unicidade entre os seus protagonistas.

Na história, baseada em fatos reais, o jovem e promissor romancista Thomas Wolfe busca, durante a depressão americana na Nova York de 1929, a publicação de seu primeiro livro, então conhecido como O Lost, mas que, após a influência do editor Max Perkins, se tornaria o sucesso Look Homeward, Angel.

Vivido com paixão por um inspirado Jude Law, Wolfe exala uma determinação que se mescla bastante com uma sutil insegurança por conta da dúvida de seu trabalho ser realmente bom. Após recusas em diversas editoras, tem a proposta de publicação feita pela editora Charles Scibner´s Sons, na qual o lendário Max Perkins trabalha como principal editor. Aqui, temos um Colin Firth, sempre contido e oposto ao espalhafatoso (no bom sentido) Law, a entregar uma atuação que inicialmente reflete sua postura pragmática em relação aos cortes que sugere em romances em estado bruto, mas que, gradativamente, revela suas fraquezas e inseguranças comuns a qualquer ser humano.

Wolfe e Perkins: amizade que supera o estritamente profissional
O filme acerta ao apresentar Perkins em seu ambiente natural, seu escritório na editora, no qual vemos as obras de Hemingway, F. Scott Fitzgerald, dentre outras que ele editou. Ao receber os originais de Wolfe, um calhamaço gigante de páginas, faz uma pergunta: “diga-me que isso é por conta do espaçamento entre as linhas”. No entanto, o desanimo se transforma em intensa curiosidade, quando começa a ler já no trem para casa os originais, só parando de fato ao chegar à última linha.

De modo eficiente e econômico, Grandage opta por descrever a condição familiar de Perkins em uma única sequência, quando o vemos chegar em casa e ser recebido por suas quatro filhas e esposa. Não encontrando um cômodo sequer que esteja desocupado para focar na leitura dos originais, ele precisa se refugiar dentro de um closet a fim de conseguir se concentrar. Nisso, percebe-se um interesse de todas por arte, literatura e teatro, sem a necessidade prolixa de apresentar cada personagem individualmente e, o mais importante, sem tirar o espectador do foco para com seu protagonista e a forma como a dedicação irrestrita ao trabalho nem mesmo o lembra de tirar o chapéu ao chegar.  

Wolfe e Aline Bernstein: relação conturbada
O roteiro de John Logan, experiente nome por trás de diversos sucessos, constrói a relação entre Max e Thomas de forma a exibir um sentimento paternal do primeiro, algo intrínseco, uma vez que vemos o editor como pai de quatro filhas e seu desejo por um filho ser expressado pela esposa vivida por Laura Linney. Não à toa, vemos Max arrumar um sofá cama para Thomas ao recebê-lo em sua casa ou tranquilizá-lo acerca de qualquer má impressão que tenha passado durante o jantar. Max quer que Thomas se sinta como parte daquela família, ao menos na relação paternal que nutre pelo jovem gênio.

No desenvolvimento daquela amizade, o sucesso recompensa o esforço de escrita de Thomas, que, após o êxito de 1929 com Look Homeward, Angel passa os próximos anos contendo sua verborragia na escrita ao conseguir condensar, com a ajuda de Max, Of Time and The River, seu segundo best seller, lançado em 1935, e From Death to Morning, do mesmo ano.

Pearce no papel de F. Scott Fitzgerald ilustra os problemas com a esposa Zelda
Em uma inundação criativa, Thomas chega a escrever cinco mil palavras por dia, algo contrastado pelo bloqueio criativo de Fitzgerald, também agenciado por Max, mas que, desde o icônico O Grande Gatsby, não consegue escrever mais do que quinhentas palavras em um bom dia de trabalho. Vivido por Guy Pearce, o autor de Este lado do Paraíso é trazido à trama de modo a contrastar a facilidade com que Wolfe parece canalizar sua criatividade para o lápis e o papel, algo muito bem ilustrado pela direção de arte, que opta por exibir o minúsculo apartamento de Wolfe tomado por folhas e mais folhas de papel contendo seus escritos.

Em outro ponto, vemos Ernest Hemingway, vivido com um carisma caricato por Dominic West, em uma cena na qual todas as marcas ligadas a pessoa do escritor são apresentadas em tela, algo que não deixa de gerar certa graça, divertindo o espectador. Falhando apenas no desenvolvimento da personagem de Nicole Kidman, que vive a amante de Wolfe, Aline Bernstein, cuja dependência afetiva para com o escritor parece não encontrar muita lógica, uma vez que seu ciúme da relação dele com o editor contrasta diretamente com os planos que o casal fez para que Thomas alcançasse o sucesso literário (algo que, claro, não carece de muita lógica em um relacionamento amoroso como aquele), o roteirista John Logan consegue, no entanto, fechar bem o caráter histórico de seu roteiro.


Dominic West em breve participação como Ernest Hemingway
Em um final arrebatador e, mais uma vez, econômico em seu modo definitivo e sem apelações dramáticas excessivas, Grandage encerra a biografia de forma eficiente, não deixando de inserir um símbolo de desconstrução física do personagem de Max que, finalmente, cedeu ao seu emocional, deixando de lado qualquer vestígio do pragmatismo que guiou sua carreira, algo que mantinha seu trabalho sempre presente em sua vida.  

Nenhum comentário:

Postar um comentário