domingo, 12 de agosto de 2012

À Beira do Caminho

(Brasil, 2012) Direção: Breno Silveira. Com João Miguel, Vinicius Nascimento, Dira Paes, Ângelo Antonio, Ludmila Rosa.


Por João Paulo Barreto

Há um peso de amargura, tristeza e culpa no João, o caminhoneiro de À Beira do Caminho (personagem homônimo interpretado com intensidade por João Miguel), que nos hipnotiza desde a primeira cena. Quando o vemos observar com um olhar doloroso a foto de uma versão dele mesmo ao lado de uma bela garota, percebemos que aquele homem sorridente não existe mais. E é daquele passado que ele tenta fugir. O álcool, a aparência maltrapilha e a inimizade são os artifícios que o faz fugir daquele João feliz do retrato. No entanto, a canção de Roberto Carlos que ele insiste em ouvir, o faz voltar. E o mais doloroso é que somos tragados por aquela volta.

João parece dirigir sem rumo, com o único intuito de fugir do passado. Evita contatos com qualquer pessoa, prefere comer sozinho na boleia do caminhão e mantém-se sempre alheio a tudo o que o cerca. Sempre fechado em seu mundo. Em À Beira do Caminho, o diretor Breno Silveira opta por trazer a história de um homem em busca de redenção. Aqui não há o otimismo do Francisco, pai dos cantores famosos, cuja história conhecemos em seu filme anterior. Não há a esperança de um futuro promissor. Aqui só há a desilusão. É um homem com um trauma tão grande em seu passado que a simples lembrança já o faz se esconder ainda mais atrás da agressividade e da inimizade.

João Miguel e o garoto Vinicius Nascimento: um achado de intensa atuação
Ele rabisca em seu caderninho algo que entendemos ser um ensaio para o que precisa dizer a alguém. Escreve, risca, amassa, joga fora. Nada parece ser suficiente para o que ele deseja transmitir à pessoa. A dor de encarar o que foi deixado para trás é tamanha que parece mantê-lo em uma inércia constante. Até que a mudança chega até ele. Na figura de Duda (Nascimento), órfão de dez anos em busca do pai que, supostamente, mora em São Paulo, mas que ele nunca conheceu. Ao se esconder na caçamba do caminhão, Duda pede uma carona ao homem, cuja agressividade não permite nenhum contato. O simples olhar do menino já o faz ter acessos de fúria. Mas vai ser através dessa conturbada relação que o modo de João ver o mundo voltará a ser o do otimismo da foto.
Um dos pontos em que a direção de Silveira acerta é o modo cadenciado, sem pressa, com que a história é contada. Gradativamente, as respostas para a dor que atormenta o caminhoneiro são respondidas pelo roteiro escrito por Patrícia Andrade (que já havia trabalhado com o diretor em dois filmes anteriores, 2 Filhos de Francisco e Era uma vez...). E esse modo lento nos aproxima ainda mais de João. O espectador passa a sentir a dor que aquele homem sente mesmo sem saber as razões de sua existência.          O processo de familiarização com o sofrimento daquele homem acontece de modo sutil, porém arrebatador. E isso se deve, também, ao modo como João Miguel se torna aquele personagem.

João em sua vida antes da derrocada
Com projetos conhecidos pelo forte impacto emocional causado no público, Breno Silveira pode até ser chamado de manipulador em um sentido que foge um pouco do lado positivo da palavra. Afinal, utilizar no filme canções que já fazem parte do imaginário popular brasileiro como as que foram compostas por Roberto Carlos, corre o risco de soar como apelação fácil para conquistar o espectador. Porém, enquanto no trailer a imagem que tínhamos era a de uma produção que iria martelar as canções do Rei até não poder mais, no longa essa utilização é bem sóbria. Muito bem pontuada, ele acerta em inseri-las em situações que complementam bem o filme, como os momentos de dor do João ou quando Duda canta e é corrigido pelo caminhoneiro por conta da letra errada (uma cena cujo timing cômico demonstra-se perfeito). Mas quando se tem medalhões da música brasileira em sua trilha, a possibilidade de pecar pelo melodramático é grande. Infelizmente, isso acontece quando dois personagens têm seu momento de entrega apaixonada e a canção Esqueça acaba sendo inserida em um cena cujo silêncio seria bem mais apropriado àquela carga dramática.
Pecando na artificialidade da sabedoria dos conselhos de Duda (“A gente não pode abandonar quem a gente ama” ou o cúmulo “Olhe para frete, João”), o roteiro de À Beira do Caminho, apesar desses clichês, utiliza a seu favor essas frases de para-choque traseiro de caminhão ao brincar nas inserções das mesmas como pontos de intervalos na trama. Então, quando vemos o ditado “Espere o melhor, prepare-se para o pior e aceite o que vier” fechar o filme com a redenção do João Caminhoneiro, entende-se como a segunda chance de vida daquele homem custou a chegar e apareceu-lhe da forma que ele menos poderia supor. 


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