quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Sicario

(EUA, 2015) Direção: Denis Villeneuve. Com Emily Blunt, Josh Broli, Benicio Del Toro, Victor Garber, Jon Bernthal, Daniel Kaluuya. 



Por João Paulo Barreto

É fácil acusar Sicario, novo trabalho do diretor Denis Villeneuve, como uma obra fascista e criada com o único intuito de se chocar o espectador. Recordo-me de ter visto comentários semelhantes na ocasião do lançamento de Tropa de Elite, no qual diversas matérias taxavam a obra de José Padilha dessa forma. No entanto, mais importante do que um rótulo, Sicario tem em sua proposta uma relevante discussão acerca da inércia das autoridades no que tange tratar bandidos monstruosos como eles realmente são.

Reconheço ser arriscado assumir lados nesse trava. Afinal, o limite entre se tornar você mesmo um fascista ao defender os pontos de vista que a obra traz sobre o modo como se deve resolver a violência do tráfico de drogas no México (ou em qualquer grande capital brasileira, diga-se) é tênue. No entanto, é imprescindível traçar uma análise acerca das ações policiais cujos atos são tão monstruosos quanto os cometidos pelos “bad guys” dessa história. Ao final, fica a pergunta: quem é o verdadeiro vilão da obra que acabamos de presenciar? Talvez, o mais relevante não seja essa pergunta, mas, sim, sabermos quem são os sobreviventes cujo futuro sombrio ainda pode ser salvo.


Macer: Guerra contra o tráfico em solo americano 
Juárez, no México, é o retrato de um território sem lei, no qual policiais corruptos lidam com o tráfico de forma conivente e os traficantes, a fim de demonstrar poder, penduram seus desafetos esquartejados nos viadutos que cortam a caótica cidade. É nesse ambiente que a agente estadunidense Kate Macer (Blunt) é inserida juntamente com uma equipe de superiores liderada por Matt Graver (Brolin) e por Alejandro (Del Toro), um ex-promotor colombiano que colabora nas investigações que podem levar a prisão do chefão Fausto Alarcon. 

Inicialmente focado na inserção de Macer naquele novo universo que lhe é desconhecido no que se refere ao México, o longa vai, gradualmente, ampliando seu leque de abordagem, trazendo à tona vez por vez as motivações de cada personagem, para, ao final, revelar a surpreendente razão para um deles agir do modo como age e o quão chocantes podem ser seus atos. Macer, apesar de experiente na atividade policial (a cena inicial do filme, mostrando sua equipe tática invadindo uma casa repleta de traficantes impressiona), é inserida naquele ambiente de modo que sua postura passa a se moldar diante daquelas circunstâncias. Sempre irredutível quanto ao que acredita, não seria difícil imaginá-la cedendo ou desistindo à medida que a percepção que aquele universo a moldará se concretiza.

Del Toro no papel do atormentado e misterioso Alejandro
É uma obra que incomoda. Que nos faz assumir lados perigosos de se assumir. Que nos faz torcer pelas pessoas erradas, mas, no entanto, nos deixa com a certeza de se entender suas razões, apesar de não concordarmos com seus atos. Monstruosidades devem ser respondidas apenas com monstruosidades? O olho por olho não acabará por nos deixar todos cegos? Quando nos deparamos com um final como o apresentado em Sicario, temos a certeza de que, de fato, o homem é produto do seu meio. Ao final, a agente Macer escuta alguém lhe dizer que aquela é uma terra de lobos e que ela não faz parte daquele lugar. Muitos são os que fazem parte, no entanto. Poucos, para o bem o para o mal, estão ali por que escolheram ficar. 

A cena do jantar ao final do filme denota bem o tipo de homem que foi arrastado para aquela terra, mas acabou por se sentir à vontade naquele ambiente hostil, reconhecendo-se como parte inseparável daquele lugar.

É um filme amargo, cujo final até tenta nos colocar um viés de esperança, mas, qualquer eco nessa tentativa é abafado pelas rajadas de metralhadora que sobrepõem os sons de um jogo de futebol entre crianças.







2 comentários:

  1. Caro atento, estou aqui para acrescentar. José Padilha eh um mero falastrão. Sues filmes enfraquecem porque ele abusa de áudios de chatissimas descrições "didáticas" ditadoras das coisas, como em Cidade de Deus de Fernando Meirelles. Os filmes "tropa de Elite" e o Pablo Escobar, a serie, perdem muito pela mania bobinha de explicar as cosias com a maneira mais feia que tem, Voz/off e voz/over. Cinema eh feito de imagens e timing. Sicario nao pode ser comparado com coisas tao medíocres. Se em Sicario existisse didatismos óbvios aii seria um problema. O filme funciona bem, Os Estados do Terror Unidos, ha muito legitimaram a tortura e trocas de regras. Este filme eh apenas um uma doença assumida, mas com melhores qualidades cinematográficas. Cordialmente. Carlosmagno Rodrigues.

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  2. Obrigado pelo feedback, Carlos. No entanto, ao citar a obra de Padilha no início do texto, referia-me ao contexto político à época de seu lançamento, quando, de fato, a taxaram de fascista. O mesmo foi feito com Sicario. O que, na minha opinião, em ambos os casos, é algo injusto. A comparação estética das duas obras não era, de fato, minha intenção. Abraço!

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